sexta-feira, outubro 05, 2007

Cinza

Traz de volta o sol
Não mais viva, sou.
Agora tudo tão cinza, insosso.
Lagrimas escorrem pelo pára-brisa

(sentindo o cheiro,
teus cachos em meus dedos)

Traz de volta o sorriso
Não mais alegre, estou.
Agora tudo tão quieto, calado.
Perdida na chuva lá fora

(sentindo o gosto,
tua boca em meus lábios)

Traz de volta o calor
Não mais brasa, sinto.
Agora tudo tão apático, gelado.
Correndo sozinha estrada afora.

(sentindo o frio,
teus braços a envolver-me)

E quando olho o retrovisor
Paisagem insensível, sem cor.
Percebo que pedaços ficaram pra trás
Olhares, afagos, cuidados,
Sem teu corpo, tanto faz.

Tudo tão cinza está.

terça-feira, agosto 28, 2007

Al dente

Em chamas encontro eu
E de olhar-te alastra mais e mais
Ardente que sou, estou
Assim, por ti.

E me queima quando encosto
em tua língua, suavizo o ardor
Enlouquecida, estou e sou
Assim, por ti.

Porque sou fogo incandescente
Incansável de arder-me em ti
Tocha insolente, al dente
Atrevo-me, sempre sua, sou.

Amanda Oliveira

quinta-feira, julho 12, 2007

Num banheiro imundo,
Acendo um cigarro,
Gargalho.

Brincando de querer o que não quero,
e sentindo o que não sinto,
Espalho.

Com palavras e salivas, infecto.
e assim adoecida
Bebo mais um trago,
Gargalo.

Debochando de mim mesma
Dos desejos que não tive,
e os amores que vivi,
Escorrego.

E deito nua neste chão gelado,
Sinto frio queimando espinha.
Teu cheiro estacionado à porta
Entrego.

E persegue, e bate, espanca e grita.
Meu sonho de mentira,
fantasia copiada.
Nego.

Que um dia fui feliz
Invento que foi eu quem quis
E conto histórias
E imagino, e crio, e enfeito
Acredito.

Realidade pré-moldada
Poesias inventadas, vidas arrastada
E faz de conta de magia
E no canto dos lábios,
Sorriso!

[ecoam meus berros]

"Mornamente"

Desespero preso na garganta, ganido.
Eco trêmulo ao meu ouvido, gemido.
Fervor na pele queimando rosto,
Tudo que sou, somente esboço.

E canto e grito, engano e escondo,
Sorriso enfeito, alvo e branco.
Uso capas e batons, espanto nudez
Máscaras em vários tons, perder lucidez.

Sangue morno corre em ébria mente
Carne seca, cansada, vida estagnada,
Nem frio ou quente, olhar dormente.

E forte brado se perde ao vento,
Engulo a seco a lágrima estocada.
Apelo! Definha-se tempo...

Amanda Oliveira

segunda-feira, junho 18, 2007

Expectativas

Como viver uma vida sem semear expectativas? E poque é tão frustrante quando não colhemos o que esperamos? Se eu plantar milho, quero e espero colher milho, e não cana-de-açúcar. Acho que o maior problema é quando não entendemos nada sobre agricultura e pegamos uma plantação já semeada, e ainda crescendo, é incrível como que pra um leigo milho é extremamente parecido com a cana desde o principio...

Mas quem disse que milho é melhor que cana? Às vezes o que esperamos colher esta em baixa no mercado, às vezes apostamos todas as fichas em ações promissoras que perdem seu valor drasticamente da noite pro dia, assim como semeamos ao vento e este por pura pirraça nos traz uma grande lavoura de algo desconhecido. Temos então duas opções, exterminar a plantação acreditando que se trata de um monte de braqueária, ou aguardar, pode ser capim estrela

O mais engraçado, é que tudo no começo surpreende, o mesmo mato que pode ser daninha pode ser feno, não se sabe a utilidade se não deixar tomar conta do pasto e florescer ou então espalhar...O mesmo que pode trazer a bonança, a boa colheita, pode exterminar toda uma safra, comprometer toda a lavoura, imagina o perigo de daninhas no plantio do café, imagina se tudo o que víssemos maquiássemos em flores? Por isso é preciso sempre dosar, nem tudo é tão maléfico quanto pensamos, e como ultima opção, sempre existe um agrotóxico para o combate

Interessante a frustação quando a apostamos todas as economias no arrendamento de um alqueire de café ja plantado (por exemplo), porque ai não há falhas de plantio, ja esta cultivado, a planta crescida, produzindo frutos de ótima qualidade, sabemos que é só investir em cuidados com a lavoura, com sua manutenção, eliminando pragas e conservando as qualidades do solo, irrigando, oferecendo condições para que a planta produza além do ano anterior, que multiplique sua capacidade, que faça da colheita uma grande safra. Mas por forças alheias a nossa vontade, a vontade do agricultor, ha uma reviravolta no mercado e o valor da saca de café despenca, todas as economias investidas são perdidas, a venda da safra nao paga o arrendamento, quem dira os gastos e investimentos, os empréstimos, os lavradores, tudo perdido, prejuizo, melhor estocar a colheita num armazem e aguardar, porque vender agora é atestado de falencia sem qualquer possibilidade de regresso

E os plantadores de soja vão ao delírio com a desgraça de seus vizinhos, a soja bem cotada, esta em alta, fica facil caçoar da desgraça do outro, é como dizem pimenta no olhos do outro é refresco. Mas o mundo do agronegócio é surpreendente, o que ta em cima, safra que vem ta em baixa, quanto maior a oferta menor a valorização, e os cafeicultores que venderam sua colheita a preço de bananas resolvem aderir a nova sensação do momento, derrubam os pés de café, adubam o solo, semeam soja e se preparam pra grande colheita.Mas tem um doido la no meio, que diz não arredar o pé, esquece seu café desvalorizado no armazém, renegocia com os bancos, faz mais emprestimo, paga os lavradores, e espera um pouco mais.Na verdade, ele se dá esse tempo, de descobrimento, pra ver até onde é capaz de suportar, se tranca, como se estivesse em banheiros sujos desesperadamente agarrado ao vaso como unica companhia. Ele sente seus dedos fracos, não conseguindo mais se agarrar a nada.Sente seu corpo cansado, sua vida despedaçada, e se adapta ao banheiro, àquela escuridão insalubre...

segunda-feira, janeiro 08, 2007

Eu que não gosto de samba
no meio da roda, pedi um cigarro
C’os pés na cadeira
dei grito de fúria
‘cabou brincadeira
Silencio das vozes, meu ecos
Atolei pé no bumbo
Pandeiro quebrei num berro
Enxuguei uma lágrima

(cansada de palavras, gestos e olhares
sentires, sentires, sentires
suas mãos, seus lábios, seu corpo)

Copo na mão, levantei
Um arroto!

Eu que não gosto de sol
No meio da praia, pedi uma dose
C’os pés na areia, marejando
engoli um suspiro
não via beleza
Flores ao mar, rasguei
Apaguei velas
Num buraco cai
Não, ela não, segurei

(dentro do buraco pensei,
que me enterre, me deixe
que seja enterrada
e assim permaneça, areia)

Eu que não gosto de mim,
No meio do parque, entrei na casa de espelhos
C’os pés apressados,
quis fugir
Meus olhos encarei
Mirei nas verdades
Fitei pensamentos
(tempo, tempo, tempo)
Definitivamente...
Não gostei, sou
murro desfigurei
Gota salgada dilacerando meu rosto

(o sangue jorrando das mãos,
caindo nos pés cansados
pedaços de mim ao chão
quebrados...)

Eu que não gosto de adeus
Naquele boteco, pedi o de sempre,
C’os pés aflitos
escondidos na mesa
olhei pro graçom
de você perguntei
Já tinha partido
Já tinha secado
Já tinha passado
Você tinha ido.

Dinha Oliveira